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Notícias

23 de dezembro de 2022

Os esperados 30 anos

*Adrian Kissmann

Sempre fui um ser inquieto. Hoje, aos 46 anos, começo a pensar que já faço parte de algumas histórias, ou seriam estórias? Comecei a faculdade com 24 anos, depois de ter vívido por algumas temporadas no exterior e, aos 27, comecei a trabalhar para o Goethe-Institut, o instituto cultural da República Federal da Alemanha para a difusão da língua e da cultura daquele país na atualidade, no exterior.

Nessa época, não via a hora de completar meus 30 anos. O saudoso Waldomiro Fleck, a quem eu muito admirava, disse uma vez que você somente é levado a sério na profissão após os 30.  O meu ímpeto concordava com ele e ansiava por findar a segunda década de vida para começar a ser levado a sério. Finalmente chegou o grande dia e vi que nada mudou, e que não me tornei nem mais, nem menos respeitado. Aliás, tive até que esperar mais dois anos para ser promovido a diretor. Moral da história: o agora é a única realidade – tudo mais é memória (passado) ou imaginação (futuro).

Mas claro que não pretendo falar mais dos meus 30 anos, mas sim, dos 30 anos do Jornal A Folha, de cuja história eu tenho muita alegria de ter participado. Precisamos voltar um pouco no tempo. Mais precisamente ao ano de 1994, quando pesquisava e escrevia sobre os 80 anos da Escola Sete de Setembro e fui convidado pela Helaine para integrar a equipe como redator.

Confesso que fiquei lisonjeado, pois estava quase completando 18 anos e escrever era algo que já me instigava. O meu professor de português no Solano, o Mestre João Inácio Zarth, dizia que uma premissa de escrever bons textos é entender. Esse foi o meu desafio. Entender o funcionamento das coisas e, principalmente, das pessoas e, em contra-partida, a importância das coisas (fatos) para as pessoas. Entendi que a missão do jovem Jornal A Folha era, além de trazer notícias de Não-Me-Toque, Victor Graeff e do recém criado município de Lagoa dos Três Cantos, também era valorizar as suas respectivas comunidades.

Meu primeiro texto escrito foi sobre a substituição de uma ponte de uma comunidade no interior levada pelas fortes chuvas. Fomos à prefeitura. Helaine e eu. Ela me apresenta ao nosso interlocutor e começa a conversa e algumas perguntas. Combinamos que eu deveria anotar as informações. Claro que não consegui escrever na mesma velocidade que as palavras eram ditas, mas guardei as informações tão bem na memória que lembro até hoje até do tom de voz e do gosto do cafezinho que nos foi servido em uma xícara dularex.

Até a chegada do gravador portátil de fita cassete, as anotações eram a base das matérias. Consegui fazer grandes progressos e percebi logo que era muito importante escrever e olhar para o entrevistado ao mesmo tempo. Outro desafio. Se por um lado o aperfeiçoamento dessa técnica me tornou um repórter mais empático, também contribuiu para que a minha letra se tornasse praticamente ilegível, numa tentativa frustrada de estenografar.

Os meus dias preferidos eram as terças-feiras, pois era o dia que eu viajava a Lagoa dos Três Cantos, com o ônibus da Hélios, das 13h15min. O recém criado município contava com o jovem prefeito Mugui (Edio Schrader), que sonhava grande para os seus conterrâneos. O parque da lagoa, que depois recebeu a prefeitura municipal já era sonhado naquela época. Ouvir o Mugui era sempre muito inspirador. Outro ponto alto do município era que muitas entrevistas ainda fazíamos em alemão. Lembro-me ainda de uma reportagem sobre o moinho centenário da família Kümpel, em Boa Vista do Guilherme, e do aniversário do Coral de Linha Glória.

O jornal me proporcionou viver outras grandes experiências, como os concertos de José Carreras, nas Missões, e de Pavarotti, em Porto Alegre. Claro que treinei duas perguntas em italiano para a coletiva com o artista. Infelizmente, uma foi feita pela fugaz jornalista da Veja e a outra não pode ser realizada, pois Pavarotti se retirou furioso da coletiva após ser perguntado “quanto teria sido o seu cachê”. Mas posso dizer que apertei a mão daquela grande voz.

Entender para escrever. Era desafiador e inspirador. Minha experiência profissional na Folha foi uma grande escola para moldar a minha futura carreira profissional em muitos aspectos. O gosto por escrever fez com que minha escolha futura fosse a faculdade de Letras. O jornal precisava chegar até os leitores na sexta-feira e, por isso nossas, noites de quarta-feira eram muito animadas, pois a diagramação precisava estar pronta até a quinta-feira. O eventual estresse da pressão do tempo era muito bem diluído com o bom humor e os interessantes assuntos da Helaine e do Roque. O circular entre diferentes públicos para tentar entendê-los e, assim, (d)escrevê-los me fez muito mais observador, empático, conciliador e sensível à diversidade.

Muito obrigado pelo grande aprendizado e pelos mais de 25 anos de amizade, querida Helaine, querido Roque. Parabéns à Folha e também à comunidade de Não-Me-Toque. Não sei se os 30 anos foram tão esperados quanto os meus, mas de uma coisa tenho certeza: o respeito e a competência já nasceram com vocês. Parabéns!

*Graduado em Letras Alemão e em Comunicação Institucional é diretor de Ensino do Goethe-Institut Porto Alegre desde 2007

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