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Notícias

18 de março de 2023

O álbum de fotografias

Por Bruna de Souza

Sentada à luz dos últimos raios de sol daquela tarde de outono, estava Dona Ofélia, uma senhora de cabelos brancos e silhueta levemente curvada. Em suas mãos, um álbum de fotografias, que mais parecia uma antiguidade. Com os movimentos já comprometidos pela idade, ela folheava as duras páginas daquela relíquia, interrompida apenas por uma lágrima que caíra sobre uma foto.

A vida tinha passado, disso não restavam dúvidas, e Ofélia sentia na carne o peso do tempo. “Como foi rápido.” Pensou ela. “Não há nada mais a ser conquistado, não existem mais motivos para discutir, tudo foi o que tinha de ser.” Mas a dúvida que lhe assolava era: “-E se não fossem os meus medos? O que eu teria feito na vida? Quais as fotografias teriam ficados registradas?”

Voltando o álbum no início, aquela senhora novamente começou a folheá-lo, mas dessa vez com os olhos fechados. E assim ela começou a contar as histórias que não havia vivido.

Quando criança, ignorando o medo do castigo dos pais, ela fugira de casa com os irmãos mais velhos na carroça da família pra visitar a cidade grande, foi lá que viu pela primeira vez uma vitrine com vestidos de luxo. O sabor da aventura despertaria nela a coragem de arriscar! Na juventude, pensou ela, teria vendido alguma vaca do sítio para comprar uma máquina de costura e virar modista. E olha lá! Eram os recortes de um velho jornal que falavam do talento da jovem garota que saiu do interior e que acabara de ganhar uma bolsa para estudar moda na Europa. Sem medo, ela não criaria raízes, ela voaria através do oceano. E assim, continuava folheando o álbum perdida em seus pensamentos. Viu nele, mentalmente, as fotografia dela com um antigo amor. Ela havia decidido viver alguns romances, apenas paixões arrebatadoras que terminavam por que eram vividas por dois seres humanos com sonhos distintos. E por fim, com as últimas páginas do álbum, estava a velhice que chegara, e lá estava ela comemorando mais um ano ao lado de uma amiga em um Café em Paris.

Voltando à luz da realidade lá estava ela sorrindo e olhando o pequeno quintal através da vidraça da janela. O jardim a esperava com o seu regador, já era hora de molhar as plantas. O marido havia falecido há algum tempo e os filhos, netos e bisnetos moravam longe. Era apenas ela, na mesma rua, na mesma casa e dessa vez, voltando inebriada da sua história de vida que nunca aconteceu.

Enquanto regava as plantas se deu conta de que aquela que estava nas fotos imaginárias não era ela. Talvez fosse alguém muito parecida. Porém, tudo o que ela viveu, por mais modesto que pudesse ter sido tinha sido real. Tinha vindo de tudo o que ela podia fazer sendo ela mesma! Se não fossem os medos, a vida poderia ter sido mais glamurosa e cheia de aventuras. Talvez! Mas se não fossem seus medos ela também não teria aprendido com a família o significado do termo “amor incondicional”, ela não teria vivido a chegada dos filhos e netos, não teria aprendido sobre paciência, responsabilidade e humildade. Talvez, ela não teria sido tão feliz! Ela adorava o pequeno jardim, cada flor tinha sido plantada por ela e cada tábua daquela casa conhecia uma pequena história que a fez chegar até aqui sendo assim como ela era. De verdade!

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